BBB, A CATARSE COLETIVA CONTRADITÓRIA

Poucos dias antes de ser decretada a quarentena eu fui no Cine Banguê e assisti a um filme incrível (na minha opinião) chamado “O FAROL” sinopse – [No final do século XIX, um novo zelador chega a uma remota ilha na Nova Inglaterra para ajudar o faroleiro local, mas o isolamento causa tensão na convivência entre os dois homens. Entre tempestades e goles de querosene, o novato tenta desvendar os mistérios que existem nas histórias de pescador de seu chefe]. – Esse filme é incrível por um motivo simples: o diretor conseguiu, com maestria, me transportar para o ambiente do filme. As semanas que esses dois homens passam juntos e isolados do mundo na ilha, são semanas difíceis. Eles, inevitavelmente, entram em conflito. Em determinado momento – quando acabam as bebidas convencionais – eles começam a beber querosene para aliviar a tensão existente. Nessa noite, vivem uma confusão mental, material e existencial. Nada é óbvio. O filme me transportou para a ilha e, por alguns instantes, eu vivi na pele a agonia daqueles homens. Uma experiência que não teria por livre iniciativa. O que quero dividir é: o BBB tem sido o querosene de muitas pessoas nessa quarentena, nas quais me incluo.

Observação: não reproduza moralismos do tipo: “esse tipo de programa”, etc. Eu mesmo nunca fui um telespectador do BBB e provavelmente não continuarei sendo. Mas todos os seres humanos, até os mais eruditos, sabem o valor do entretenimento barato. Serve como álcool. Ninguém aguenta ser sério o tempo todo. Se é, não sabe viver. Os moralistas dizem: “a TV esvazia nossas mentes”. Eu diria que, às vezes, é necessário limpar a mente de tanta informação, sobretudo em momentos tão difíceis.

O BBB tem sido meu querosene. É o que me faz esquecer dos problemas concretos que se colocam à minha frente como um muro de tijolos erguidos entre camadas de cimento. É o que me liberta do mundo real. É a Catarse. – Libertação do que estava reprimido ou sensação de alívio causada pela consciência de sentimentos ou traumas anteriormente reprimidos. – E pelo que tenho acompanhado, tem sido a catarse de muita gente. É a catarse coletiva brasileira. Em um dos últimos paredões houve 1,5 bilhão de votos. Isso é sete vezes a população brasileira e mais uns quebrados. É a eleição presidencial extra de 2020. O brasileiro, convenhamos, já não aguenta mais ter que esperar de 04 em 04 anos para debater, brigar com todo mundo, provar que está certo. O BBB tem paredão toda semana, muito melhor que o TSE (para quem gosta de se engajar). Não estou fazendo proselitismo do programa em questão, muito pelo contrário. Não fosse a quarentena, eu desconheceria todos os participantes. A quarentena é que torna o querosene uma opção viável de divertimento.

Só que nessa história há uma contradição conceitual. O nome ‘Big Brother Brasil’ trata-se de uma clara referência literária ao “Grande Irmão” do romance 1984, escrito por George Orwell, um ser que controla a tudo e a todos vigiando as pessoas por televisões. Na obra, ele diz “Big Brother is watching you”. Ou seja, o motivo do nome do programa é justamente o fato de que os participantes estão sendo assistidos em todos os seus atos. Portanto estão sujeitos ao Grande Irmão.

Eis a contradição. A nossa catarse coletiva, a nossa libertação do confinamento está justamente na experiência de sermos o Grande Irmão que controla o confinamento daquelas pessoas.